A Fundação Richard Tucker, que leva o nome de um dos principais tenores do século XX e atua no auxílio na formação de cantores nos Estados Unidos, demitiu na noite de segunda-feira um de seus diretores, David Tucker, filho do tenor, por comentários de cunho racista feitos em redes sociais ao longo do final de semana.
No sábado, a soprano Julia Bullock compartilhou em seu Facebook uma matéria do Washington Post na qual grupos que têm protestado em Portland contra a violência policial direcionada à comunidade negra afirmavam que membros haviam sido presos por oficiais federais em carros sem identificação.
Em resposta, Tucker comentou elogiando a ação policial. “Ótimo, é preciso se livrar desses vândalos e não ligo para onde eles serão levados. Eles são uma doença em nossa sociedade”, escreveu, elogiando ações comandadas pelo presidente Donald Trump.
Em seguida, o tenor afro-americano Russel Thomas lembrou que a Fundação Tucker deu seu primeiro prêmio apenas uma vez a um cantor negro. Tucker então afirmou que “usar a questão da raça é só mais uma desculpa conveniente para modificar os padrões excelentes de qualidade vocal” do prêmio. O comentário despertou reações imediatas.
O tenor Lawrence Brownlee, único negro a receber o prêmio, qualificou as declarações de Tucker como “racistas e decepcionantes”. A soprano Lisete Oropesa, vencedora do ano passado, afirmou estar chocada com as ideias “racistas e decepcionantes”. A mezzo soprano Joyce Di Donato, que venceu o prêmio em 2002 e hoje é membro do conselho da fundação, foi ao Twitter dizer que renunciaria a seu posto na instituição se Tucker fosse mantido na organização. “Esses comentários não foram feitos no calor do momento. Estão repletos de ódio”, afirmou a mezzo soprano Stephanie Blythe também em suas redes sociais.
Today I read very disappointing racist comments by an important member of the @RTuckerMusicFdn board on a colleague’s page, & they’re still up! This org supports American singers. yet has only awarded ONE black singer the big award in 39 years! #changemusthappen Do better RTMF!!
— Lisette Oropesa (@Lisette_Oropesa) July 19, 2020
Em um primeiro momento, a Fundação Tucker emitiu um comunicado no qual afirmava “permanecer comprometida com a oferta de oportunidades iguais por meio de nossos programas”. Mas a posição não foi suficiente. A crítica musical americana Anne Midgette foi a primeira a condenar a fundação.
It is *devastating* to read, Lisette. I've informed the Foundation that I can no longer serve on the board unless he is removed and his comments denounced.
— Joyce DiDonato (@JoyceDiDonato) July 20, 2020
“Declarações educadas e sutis sobre o problema da música clássica com questões raciais não são mais suficientes e é simplesmente estúpido agir como se o problema fosse apenas falta de oportunidade e não uma infraestrutura branca surda à questão e muitas camadas de intolerância nauseante”, ela escreveu. “Seguem duas sugestões para a Fundação Tucker: mandem embora membros racistas de seu conselho; e apoiem artistas negros dando a eles seus prêmios. Precisamos de menos comissões de investigação e de declarações vazias de solidariedade e de mais ação.”
Let’s stop the handwringing about classical music’s race problem, call out the bigotry for what it is, and see some action. https://t.co/HuMuVVR7oM
— Anne Midgette (@classicalbeat) July 20, 2020
Em seguida, a fundação comunicou a decisão de expulsar David Tucker de seu conselho.
O episódio acontece em meio várias reflexões a respeito do preconceito racial no meio da música clássica, que foi tema de uma série de matérias do New York Times: em uma delas, o crítico Anthony Tommasini sugere que as audições devem deixar de ser feitas com biombos, para que políticas de inclusão tenham de fato efeito.
Uma pesquisa feita pelo site Middle Class Artists também tocou na questão, mostrando que cantores negros tiveram menos oportunidades que colegas brancos ao longo da história do Metropolitan Opera House. No começo do mês, a Filarmônica de Nova York, em meio aos protestos contra a morte de George Boyd pela polícia, já havia anunciado um plano com metas para tratar dos “mais altos ideais de justiça racial, diversidade e inclusão” dentro da instituição.
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